• Considerações Gerais sobre “A Gênese”
• Introdução à primeira edição publicada em janeiro de 1868(1)
• A dama da Doutrina Espírita: visão científica
• DEUS I
Considerações Gerais sobre “A Gênese”
No Pentateuco bíblico (cuja autoria é atribuída a Moises) o livro denominado Gênese é o primeiro, pois nele se pretende, em linguagem simbólica, narrar a origem do mundo e do homem, segue-se a ele Êxodo, Levíticio, Deuteronômio e Números, cada um especificando um assunto e representando uma fase da história do povo hebreu, que deu origem dos grupos israelita e judeu.
Na Codificação Espírita “A Gênese” é o quinto livro de autoria de Allan Kardec, sendo os anteriores por ordem de seqüência: O Livro dos Espíritos (18/04/1857); O Livro dos Médiuns (15/01/1861); O Evangelho Segundo o Espiritismo (abril de 1864); O Céu e o Inferno (01/08/1865); e A Gênese (06/01/1868).
Surgiu A Gênese onze anos após o lançamento de O Livro dos Espíritos, quando este já havia conquistado o crédito de ser a expressão do pensamento dos espíritos, cuja autoridade é firmada na concordância dos ensinamentos dos espíritos e não apenas a opinião pessoal de um deles.
Na Revista Espírita: Jornal de Estudos Psicológicos (novembro de 1867) Kardec anuncia que o livro está no prelo para aparecer em dezembro com 500 páginas. Nessa mesma revista (janeiro de 1868) o Codificador informa que desde de 06 de janeiro a obra já está à venda e apresenta a tábua da matéria. Em nota de rodapé apresenta o quanto custará a obra e a tarifa de correio para os diferentes paises. É com satisfação que constatamos que o Brasil aparece na lista (1 franco e 80c) o que nos permite supor que já havia brasileiros que tinham o hábito de adquirir tanto a Revista como as novas obras editadas. Nesse mesmo ano (fevereiro) é publicada uma “Apreciação da obra” assinada por São Luís e psicografada em 18 de dezembro de 1867 pelo médium Sr. Desliens. Nesse mesmo número da revista Kardec informa sobre a segunda edição da obra considerando que a primeira edição estava quase esgotada. Embora a quantidade de exemplares da primeira edição não tenha sido mencionada há que se considerar que o livro foi um sucesso de vendas pois em praticamente um mês a edição foi esgotada. Ainda nesse mesmo número é informado que o capítulo primeiro da obra “Caracteres da Revelação Espírita” estava sendo editado em uma brochura a parte como uma forma de dar a conhecer o verdadeiro caráter da doutrina espírita e o mesmo tempo como uma refutação de certas críticas.
Assim se expressou São Luís:
“Esta obra vem a ponto, no sentido que a doutrina está hoje bem estabelecida do ponto de vista moral e religioso. Seja qual for a direção que tome de agora em diante, tem precedentes muito arraigados no coração dos adeptos, para que ninguém possa temer que ela se desvie de sua rota.
O que importava satisfazer antes de tudo eram as aspirações da alma; era encher o vazio deixado pela dúvida nas almas vacilantes em sua fé. Essa primeira missão hoje está cumprida. O Espiritismo atualmente entra em uma nova fase. Ao atributo de consolador, alia o de instrutor e diretor do espírito, em ciência e em filosofia, como em moralidade. A caridade, sua base inabalável, fez dele o laço das almas ternas; a ciência, a solidariedade, a progressão, o espírito liberal dele farão o traço de união das almas fortes. Conquistou os corações amigos com as armas da doçura; hoje viril, é às inteligências viris que se dirige. Materialistas, positivistas, todos os que, por um motivo qualquer, se afastaram de uma espiritualidade cujas imperfeições suas inteligências lhes mostrariam, nele vão encontrar novos alimentos para sua insaciabilidade. À ciência é sua senhora, mas uma descoberta chama a outra, e o homem avança sem cessar com ela, de desejo em desejo, sem encontrar completa satisfação. É que o espírito tem suas necessidades, também ele. É que a alma mais ateísta tem aspirações secretas, inconfessadas, e que essas aspirações reclamam seu pasto.
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A questão de origem que se liga à Gênese é para todos causticante. Um livro escrito sobre esta matéria deve, em conseqüência, interessar a todos os espíritos sérios. Por esse livro, como vos disse, o Espiritismo entra numa nova fase e esta preparará as vias da fase que se abrirá mais tarde, porque cada coisa deve vir a seu tempo. Antecipar o momento propício é tão nocivo quanto deixá-lo escapar.”
Introdução à primeira edição publicada em janeiro de 1868(1)
Nessa introdução Kardec nos traz importantes informações sobre a obra que seria última por ele publicada. Informa que após 10 anos da publicação de O Livro dos Espíritos os “princípios fundamentais nos quais colocou suas bases foram sucessivamente completados e desenvolvidos em conseqüência dos ensinos progressivos dos Espíritos”.
Enfatiza, o que desde o início da Codificação afirmava, que a obra era iniciativa dos Espíritos, entretanto ressalta que não as idéias de um Espírito, o que seria apenas uma opinião, mas sim o resultado coletivo e concordante dos ensinamentos provindo da espiritualidade conferindo-lhe, assim o caráter de universalidade.
Defende a idéia que na obra era importante colocar como subtítulo a expressão “Segundo o Espiritismo”, uma vez que isso indica que os assuntos contidos no livro evidenciam concordância como corpo da Doutrina já consolidado nos quatro outros livros publicados (O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho Segundo o Espiritismo e O Céu e o Inferno)
Afirma ainda que as matérias que comporiam o livro estavam de algum tempo preparadas, mas que aguardava chegar o momento de publicá-las.
É destacada a importância que a Revista Espírita: Jornal de Estudos Psicológicos teve nesse processo uma vez que “no estado de esboço, a maioria das idéias que são desenvolvidas nesta obra” já haviam sido publicadas nessa revista as guisas de terreno de ensaio visava sondar a opinião dos leitores da revista. No CAPÍTULO VI de A Gênese Kardec destaca que o mesmo foi integralmente reproduzido de publicações da Revista de uma série de comunicações à Sociedade Espírita de Paris em 1862 e 1863, com o título Estudos Uranográficos, assinados por Galileu e obtidos através do médium C.F., que Zeus Wantuil e Alfredo Tiesen(2) afirmam ser Camille Flammarion.
Reafirma que a busca incessante da Doutrina é apresentar os fenômenos até aquele momento tidos com sobrenaturais uma vez que só através da compreensão das relações do mundo material com o mundo espiritual esses fenômenos podem ser explicados.
Como bom pedagogo nesta introdução Kardec prepara o leitor para a compreensão do conteúdo do livro e embora não o faça de forma explicita toda a sua argumentação remete para necessidade do conhecimento dos demais livros, visto ser esse uma seqüência natural dos demais.
Referências
1) KARDEC, ALLAN. A Gênese, Tradução de Salvador Gentile, Araras: Instituto de Difusão Espírita, 22ed, 2000.
2) WANTUIL,Z. TIESEN,F. Allan Kardec, Rio de Janeiro:FEB,1980, v.III.
A dama da Doutrina Espírita: visão científica
Circula nos meios espíritas um gráfico, cuja autoria desconhecemos, que apresenta O Livro dos Espíritos como um tronco central a partir do qual se originaram as demais obras da Codificação.
A Gênese teria sua origem no livro primeiro de O Livro dos Espíritos: Das causas Primárias, constituído de quatro capítulos a saber: Deus, Elementos gerais do Universo, Criação, Princípio Vital. Sem dúvida esses tópicos são aprofundados em A Gênese, entretanto essa obra vai muito além, pois, como bem esclarece Kardec na Introdução da Primeira Edição, este livro vinha após um período de exposição da Doutrina à análise e críticas sendo que nenhum tópico recebeu desmentido da experiência, e que a mesma era um complemento da aplicação do Espiritismo de um ponto de vista especial, ou seja, tiraria os fatos até então da categoria do maravilhoso e sobrenatural que passam a ser explicados como fatos naturais que agora, através da doutrina espírita, teriam as leis que os regem claramente descritas.
Como visto na matéria anterior São Luiz declara que o livro se dirige àqueles de alma forte que necessitavam de elementos científicos para se render definitivamente à doutrina. Diz que com esse livro a ciência passa a ser a dama da doutrina (destaque nosso) evidenciando uma visão profética dos muitos pesquisadores que buscaram, nas experiências científicas, a comprovação do mundo espiritual e sua relação com o mundo corpóreo que foram numerosos na Europa e América no período que sucedeu ao desencarne de Kardec.
Dama da doutrina porque a obra se propõe a tratar dos pontos controversos entre ciência e religião dando um basta nas explicações sobrenaturais que alicerçavam a compreensão da criação do universo e dos milagres e predições evangélicas.
Os Espíritos, ao revelarem a existência de uma “substância” –Fluido, que não podia ser identificada pelos métodos laboratoriais existentes na época, abrem a possibilidade de compreensão dos processos até então tidos como Mistérios de Deus, que seriam incompreensíveis aos homens.
Mas, diriam os homens de ciência, revelação!!!. Isto está no terreno do místico, então Kardec coloca como primeiro capítulo da obra os Caracteres da Revelação Espírita de forma a mostrar que a mesma é fruto das considerações concordantes dos Espíritos, portanto essa revelação não é oriunda de um Espírito em particular, mas fruto de ensinamentos que além de concordantes têm também um caráter de generalidade. Nesta revelação pode-se identificar “um critério da lógica que faz a força da Doutrina”.
No capítulo seguinte DEUS, trata de outro ponto de cisão entre ciência e religião. O Deus apresentado nada tem a ver com aquele deus antropomorfo, punitivo e impositivo que as religiões fizeram o desfavor de apresentar aos seus adeptos e selaram a separação entre ciência e religião.Argumenta sobre a existência de Deus, sua natureza, a providência divina e expõe que a visão de Deus está na ordem direta de nossa evolução espiritual.
O terceiro capítulo-O Bem e o Mal-se baseia na teoria evolutiva onde discorre sobre instinto e inteligência como fases do desenvolvimento do princípio inteligente. A transitoriedade do mal por ser ausência de desenvolvimento.
Assim Kardec clarifica as premissas básicas para tratar da matéria apresentada a seguir.
DEUS I
Nilza Teresa Rotter Pelá
Kardec dedica o capítulo II da primeira parte do livro A Gênese ao estudo de Deus enfocando o assunto em quatro aspectos: Existência de Deus; A Natureza Divina; A Providência; A Visão de Deus.
O codificador iniciara O Livro dos Espíritos pelo mesmo assunto, sem dúvida, por considerar que sendo ELE (DEUS) a causa primária de todas as coisas “é o ponto que importa considerar antes de tudo”.
Nos dois livros pode-se identificar a preocupação de Kardec em afastar a visão antropomórfica de Deus. Entende-se por antropomorfismo a “tendência para atribuir, ou a forma de pensamento que atribui formas ou características humanas a Deus, deuses, ou quaisquer outros entes naturais ou sobrenaturais” (1); tanto que a primeira questão de O Livro dos Espíritos é Qu’est-ce que Dieu (O que é Deus) e não quem é Deus.
O dicionário (1) nos informa: QUE-pronome interrogativo significa que espécie de; qual. que coisa; QUEM -alguém que; uma pessoa que, então podemos ver que Kardec usou o pronome adequado.
Ao ensinar Espiritismo deve ser considerado que a coletividade humana carrega consigo um pesado fardo chamado atavismo religioso. Ele se constitui por um conjunto de valores intrínsecos que influenciam muito o comportamento humano. (2) Atavismo é um termo oriundo da genética que significa “o reaparecimento, em um descendente, de um caráter não presente em seus ascendentes imediatos, mas, sim, em remotos” (1), ou seja, em termos comportamentais é o aparecimento de crenças e costumes que se teve durante várias encarnações e que se supunha desaparecidos, entretanto eles se fazem presentes subitamente em nosso comportamento.
Assim é a concepção de Deus; muitos de nós formamos a imagem de Deus a nossa imagem e semelhança.
As antigas culturas tiveram a sua imagem de Deus representado por figuras humanas. Entre os egípcios Amon Ra era representado tendo um corpo humano e uma cabeça de ave, na mitologia grego-romana Zeus e Júpiter eram representados como sendo um velho robusto de barbas brancas sentado em um trono e entre os celtas Cernnunos era um homem de meia idade, forte com dois cornos na cabeça.(3)
Na capela Sistina no Vaticano encontramos, na representação da criação do homem Deus como a imagem de Zeus rodeado de anjos com aspecto infantil.
No evangelho segundo João encontramos Jesus transmitindo à mulher samaritana a sua concepção de Deus: Deus é espírito, e os seus adoradores devem adorá-lo em Espírito e Verdade.(João cap 4 V.24). Na sua primeira epístola universal João ratifica o que havia sido ensinado por Jesus quando afirma: Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor (cap 4, v.8 ); A nova que dele temos ouvido e vos anunciamos é esta: Deus é luz e nele não há treva alguma (cap 1, v.5 ).
Já idade média Tomás De Aquino (1225-1274) asseverava: “o homem é a imagem de Deus, não segundo seu corpo, mas segundo aquilo pelo que o homem supera os outros animais. O homem é superior aos outros animais pela razão e pelo intelecto. Portanto, é segundo o intelecto e a razão, que são incorpóreos, que o homem é a imagem de Deus”.(3)
Em A Gênese cap. 2 item 12 Kardec afirma:” São ridículas essas imagens em que Deus é representado pela figura de um ancião de longas barbas e envolto num manto.” Outro aspecto digno de reflexão quando se procura compreender DEUS é o dogma da Santíssima Trindade. A Trindade é a doutrina acolhida pela maioria das igrejas cristãs que acredita no único Deus subsistente em três pessoas distintas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Para os seus defensores, é um dos dogmas centrais da fé cristã sendo considerado um dos mistérios mais difíceis de interpretar e compreender.As denominações cristãs trinitárias consideram-se monoteístas. As outras duas grandes religiões monoteístas, o Judaísmo e o Islamismo, bem como algumas denominações cristãs, não aceitam a doutrina trinitária.(3)
A palavra Trindade não se encontra no Novo Testamento, nem nos escritos dos padres apostólicos. Contudo, segundo os teólogos, o mistério estava arraigado na primitiva comunidade cristã, “como o demonstra a fórmula do Batismo”.(4) Esse dogma foi alvo de intenso debate dentro da Igreja católica que se iniciou em Alexandria (325). Arius no livro Thalia defendia que Jesus era criatura de Deus e não parte dele; Atanásio defendia a Santíssima Trindade. O Concílio de Nicéia acata o dogma da Santíssima Trindade e Arius é considerado herege.
Os Espíritos da codificação, no O Livro dos Espíritos, dão a concepção Espírita de trindade (questão 27). -Há então dois elementos gerais do Universo: a matéria e o Espírito? “Sim e acima de tudo Deus, o criador, o pai de todas as coisas. Deus, espírito e matéria constituem o princípio de tudo o que existe, a trindade universal”. Ainda ensinam que (questão 1) “Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas” e que Espírito é (questão 23). “o princípio inteligente do Universo.” Jesus criatura de Deus como todos os Espíritos foi (questão 625) O tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo.
Referências
1) NOVO AURÉLIO. Séc.XXI, versão 3.0- digital
2) HUAIXAN, J.Q.T. O mal do mito. In: https://www.novavoz.org.br/rfm006.htm, capturado em 26/10/07
3) https://pt.wikipedia.org/wiki/P%C3%A1gina_principal
4) DOGMATISMO E ESPIRITISMO; In: https://www.ceismael.com.br/index.htm